Mágoas De Boiadeiro (SALP 61047) - (1971) - Pedro Bento e Zé Da Estrada

Fim Do Zé Carreiro
Conheci há muito tempo o caboclo Zé Carreiro
Não tinha nenhum amigo no sertão Ingazeiro
Caboclo sem religião o seu Deus era o dinheiro
Todo povo sem benzia quando via o Zé Carreiro

Numa sexta-feira santa quando a procissão saiu
O povo todo chorou, Zé Carreiro até sorriu
O malvado era descrente quis fazer um desafio
Botou a boiada no carro e de viagem seguiu

Mais veio uma tempestade, foi a sua perdição
Depois de andar duas léguas o carro foi num grotão
A boiada se encolheu com o estrondo do trovão
Zé Carreiro blasfemava no meio da escuridão

Por ser um homem malvado, caboclo sem religião
Dava pancada nos bois e chuchava de ferrão
Foi tirando a garrucha e baleando as criação
Quando um boi numa chifrada lhe arrancou o coração

Daí a chuva aumentou que parecia um tufão
Um raio riscou o céu e brilhou na escuridão
Quando a faísca caiu no estrondo do trovão
Fulminou toda boiada, ficou em cinza o grotão

Até hoje os viajantes que passam naquela estrada
Vê um velha sepultura com uma cruz abandonada
Na noite de sexta-feira vem ali alma penada
Gemendo na sepultura e gritando com a boiada

Ilusão Da Vida
Tenho esperança que um dia a felicidade
Tenha de mim piedade e volta a me provocar
Antigamente vivia alegre cantando
O tempo foi passando, hoje eu só vivo a chorar

Você cabocla arruinou a minha vida
Fingiu ser minha querida e depois me abandonou
Os seus carinhos eram tudo fingimento,
Recordando ainda lamento aquele seu falso amor

O meu esforço que eu fiz por ti ingrata
Como paga me maltrata e nunca me agradeceu
Você foi embora com outro homem a seu lado
Não quis mais o meu agrado e pra sempre me esqueceu

Se algum dia sentir no seu coração
Verás que eu tinha razão assim na mente me vem
Pois você vai implorar arrependida
Nesta ilusão da vida você há de sofrer também

Santa Cruz Da Serra
No seio da minha terra no alto de uma serra existe uma santa cruz
Que nunca será esquecida por ter nela refletida a imagem de Jesus
E o Jesus amado que morreu crucificado pra salvar o pecador
Sua imagem ali erguida e uma lembrança querida que um missionário deixou

Num domingo de setembro no fim da santa Missão
Dom Fernando um missionário quis deixar recordação
Suspendendo o cruzeiro com amor e devoção
Auxiliado pelo povo da divina religião

E às três horas de tarde o padre fez reunião
Da matriz de Trabijú saímos em procissão
Todo o povo acompanhou a nossa congregação
Cumprindo com grande fé o dever de um bom cristão

Aquela cruz da colina representa o santuário
Batizada pelo povo com a benção do vigário
Ficará nos corações como contas de um rosário
Seguindo de uma lembrança deste santo missionário

Quem passar naquela terra vê no alto o cruzeiro
Representando a imagem do nosso pai verdadeiro
Nosso senhor Jesus Cristo, pai eterno e padroeiro
Abençoa a humanidade deste torrão brasileiro

Minha História De Amor
Foi na festa da fazenda, do seu coronel Janjão
Que eu conheci minha Rita formosa como um botão
Seus olhos preto me olharam, senti meu corpo a tremer
Não foi preciso mais nada pra nós dois se compreender

Como eu era cantadô afamado do sertão
Logo todos me pediram "A saudade do Matão”
Neste eu mundo choro a dor por uma paixão sem fim

Num canto a Rita chorava fui logo saber porque
Não é por nada responde é de orgulho de vancê

Sempre gostei de ser livre levando a vida a cantar
Mas ali mesmo com a Rita eu combinei me casar
Mas Deus não quis que assim fosse não quis vê a nossa alegria
Uma semana depois, a minha Rita morria

E no seu leito morrendo, apertando minha mão
Me pediu; cante baixinho "A saudade do Matão”
Neste eu mundo choro a dor por uma paixão sem fim
Não pude mais continuar embaçaram os olhos meus
Olhei chorando pra Rita ela já estava com Deus

E hoje sempre que escuto "A saudade do Matão”
Parece que eu vejo a Rita deitada no seu caixão
Toda vestida de branco como querendo dizer
Não foi nada vou contente orgulhosa de vancê

Malandro
Eu nasci como nasce qualquer vagabundo
Até hoje eu não soube quem foram meus pais
Cresci nas tabernas ao som das garrafas
Pescando de linha na beira do cais
Se eu almoço eu não janto, se eu janto eu não seio 
Pra mim é o bastante comer uma vez
Pra casa eu não levo nenhum desaforo
Visito a cadeia dez vezes por mês

Às vezes me enfio num grosso tufão
Se a noites é de lua eu encosto na esquina
Cantando modinha com meu violão
Lá pra meia noite que o sono me aperta
Então eu me deito em qualquer lugar
As pedras da rua são meu travesseiro
E a porta da igreja me serve de lar

Se saio na rua disposto a brigar
Todos se intimidam da minha navalha
E assim vou vivendo sem eira nem beira
Gozando as delicias da vida canalha
Lenço no pescoço, cigarro no queixo
Chapéu desabado e bengala na mão
Se encontro a polícia já vou provocando
E se toco a poeira levanta do chão

Um dia fui preso por quatro soldado
Na briga que eu fiz no bar do café
Valeu a firmeza que eu tenho no pulso
Valeu a destreza que tive nos pés
Dei uma pernada que o quepe voou
Era levantar e tornar cair
Faço isso pra dar trabalho a polícia
Até a morte se lembra de mim

Filho De Índio
Nasci como nasce um filho de índio
Criei  no regime que é do sertão
Com chapéu de couro e peixeira na cinta
Gosto do traje que tinha o lampião
Trazia a guaiaca cheia de bala
Revolver schimidt de marca alemã

Eu ía em catira sem me convidar
Fazia arruaça de prevenção
Batia em violeiro que fosse marrudo
Quebrava a viola e parava a função
Se o dono da festa quisesse achar ruim
Entrava no cano do meu garruchão

Dentro de venda eu entrava a cavalo
Corria e descia as garrafas no chão
A pinga no copo em mexia com a faca
Comigo bebia qualquer valentão
Se ele enfrentasse eu jogava na cara
De cabra valente eu batia a facão

Um dia encontrei o tal da malandro
De faca na cinta e porrete na mão
Eu bati o pé o malvado correu
Errou o caminho e bateu no portão
Deixou o paletó enroscado na cerca
Pra ele acabou sua fama de bom

Mágoa De Boiadeiro
Antigamente nem em sonho existia, tantas pontes sobre os rios nem asfalto nas estradas
A gente usava quatro ou cinco sinueiros pra trazer os pantaneiros no rodeio da boiada
Mas hoje em dia tudo é muito diferente com progresso nossa gente nem se quer faz uma idéia
Quem entre outros fui peão de boiadeiro por este chão brasileiro os heróis da epopéia

Tenho saudade de rever nas corruptelas as mocinhas na janela acenando uma flor
Por tudo isso eu lamento e confesso que a marcha do progresso é a minha grande dor
Cada jamanta que eu vejo carregada transportando uma boiada me aperta o coração
E quando olho minha tralha pendurada de tristeza dou risada pra não chorar de paixão

O meu cavalo relinchando pasto afora e por certo também chora na mais triste solidão
Meu par de esporas, meu chapéu de aba larga, uma bruaca de carga, o berrante e um facão
O velho basto, o sinete e o apeiro, o meu laço e o cargueiro, o meu lenço e o gibão
Ainda resta a guaiaca sem dinheiro deste pobre boiadeiro que perdeu a profissão

Não sou poeta sou apenas um caipira e o tema que me inspira é a fibra de peão
Quase chorando imbuído nesta mágoa rabisquei estas palavras e saiu esta canção
Canção que fala da saudade das pousadas que já fiz com a peonada junto ao fogo de um galpão
Saudade louca de ouvir o som manhoso de um berrante preguiçoso nos confins do meu sertão

Ranchinho De Taquara
Eu nasci naquela serra num ranchinho beira chão
Eu adoro a minha terra lá foi minha criação
Só não ama sua terra quem não tiver coração

Meu ranchinho é de taquara amarrado de cipó
Quando a tarde é noite clara só se escuta o chororó
Piando naquelas furnas lá pra aqueles cafundó

De lá mudei prá cidade hoje estou morando aqui
Mas tenho muita saudade lá do rancho onde eu nasci
Mas o que vamos fazer minha sorte eu vou cumprir

Meu destino é cantar canto quase todo dia
Canto pra me disfarçar quase só de autoria
Vou deixar da minha viola quando a morte vier um dia

Irmão Do Ferreirinha
Na cidade de Pardinho no jornal foi anunciado
Vai haver um grande rodeio e o povo foi convidado
Lá chegou um potro famoso que um peão tinha matado
Pra quem agüentasse seus pulos dois milhões tá reservado
 
Quando eu li essa notícia o coração quase parou, ai
Por saber que o Ferreirinha esse potro é quem matou
Perdido pra aqueles campo mais bardoso ainda ficou, ai
Pra mim foi um desafio a notícia que chegou
 
Dois milhões é bom dinheiro, mas mais vale a vida minha
Lembrava no acontecido mas coragem ainda eu tinha
Mandarei fazer uma campa com esse dinheiro que vinha
É o derradeiro presente que eu darei ao Ferreirinha
 
Imaginei a noite inteira resolvi ir pro rodeio
Quando cheguei no povoado o negócio tava feio
O potro tinha jogado mais de seis peões do arreio
Parecia até o demônio bufando e os olhos vermelhos
 
Quando vi o redomão já conheci sem demora
Saltei em pelo no bicho com fé em Nossa Senhora
O potro caiu três vezes sangrando na minha espora
Deu o derradeiro pulo no prazo de meia hora
 
O povo bateram palma com a vitória que era minha
Trouxe o potro no palanque fui buscar o prêmio que eu tinha
Perguntaram do meu nome do lugar de onde eu vinha
Eu vim lá do Espraiadinho sou irmão do Ferreirinha

A Morte Do Carreiro
Isto foi no mês de outubro regulava o meio dia
O sol parecia brasa queimava que até feria
Foi um dia muito triste só cigarra que se ouvia               
O triste cantar dos pássaros naquelas matas sombrias
 
Numa campina deserta uma casinha existia
Na frente uma palhada onde a boiada remoia
Na estrada vinha um carro com seus cocões que gemia
Meu coração palpitava de tristeza ou de alegria
 
Lá no alto do serrado a sua hora chegou
O carro tava pesado e uma tora escapou
Fui por cima do carreiro e num barranco imprensou
Depois de uma meia hora que os companheiros tirou
 
Quando puseram no carro já não podia falar
Somente o que ele dizia tenho pressa de chegar
Os companheiros gritavam com a boiada sem parar
Avistaram a taperinha e as crianças no quintal
 
Os galos cantaram triste ai, ai, ai, ai
No recanto aonde eu moro, ai, ai, ai, ai
 
Levaram ele pra cama não tinha mais salvação
Abraçava seus filhinhos fazendo reclamação
Eu sinto estes inocentes ficar sem uma proteção
Fechou os olhos e despediu deste mundo de ilusão

Rei Da Capa
Lá pras bandas de Barretos na maior zona de gado
Foi berço de criação de muitos peão afamado
O Petico e Gomercindo, Zé Pretinho e Colorado
Quatro heróis do arreio pelo povo consagrado
E foi neste mesmo mapa que nasceu o Rei da Capa campeão de dois estado

O Turquinho é um toureiro de talento e suporte
O seu nome é conhecido desde o sul até o norte
Para sair vitorioso nunca dependeu da sorte
É um caboclo de confiança destemido e muito forte
Pra lutar com boi selvagem é um peão de coragem que não teme a própria morte

Nasceu em Jaborandi o mundo guiou seus passos
Abandonou os estudos pela inclinação do laço
Nessa lida tão pesada nunca encontrou fracasso
Enfrenta qualquer perigo com muito desembaraço
Sem mostrar muito serviço ele faz qualquer mestiço ficar preso nos seus braços

No estado de São Paulo teve pouco paradeiro
Atravessou as montanhas do grande estado mineiro
De cidade em cidade orientava os companheiros
Demonstrando o seu valor de campeão dos picadeiros
O Turquinho é um homem que sabe honrar o nome de paulista e boiadeiro

Violeiro Desprezado
Já fui rico, hoje eu sou pobre Eu já tive um bom viver
Conquistei minha infância o amor de um bem querer
Hoje eu vivo desprezado de certo é por merecer
Tanto esforço eu tenho feito nem assim não quis valer

A minha comparação é fácil e é de compreender
Um letra em breve em nome pro leitor que sabe lê
Não precisa pingar o ‘i" quando for pra se escrever
Quem aprendeu na escola e conhece o "abc"

A respeito a querer bem eu já fiz por esquecer
Já perdi minha esperança com quem eu tinha prazer
Agora daqui por diante eu vou deixar as águas correr
Meu despique é inventar moda cantar pra você vê

Eu cantando eu me disfarço e faz desaparecer
Aquelas horas perdida que eu saía pra te ver
Arriscando a minha vida Nem que fosse pra morrer
E você foi muito ingrata não soube me agradecer

Não maltrato e nem ofendo com todos quero viver
Tudo isso a Deus pertence com a sorte vou combater
Peço a Deus que te ajude nunca te faça sofrer
O mal se paga com o bem é o que me resta dizer

Msicas do lbum Mágoas De Boiadeiro (SALP 61047) - (1971)

Nome Compositor Ritmo
Fim Do Zé Carreiro Serrinha / Ado Benatti Toada
Ilusão Da Vida B. Amorim / Teddy Vieira Toada
Santa Cruz Da Serra Benedito Seviero / Biguá Toada
Minha História De Amor Carreirinho / Armando Rosa Cururu
Malandro Carreirinho Lundu
Filho De Índio Pedrão / Anísio Teodoro Rojão
Mágoa De Boiadeiro Nonô Basílio / Índio Vago Toada
Ranchinho De Taquara Carreirinho Cururu
Irmão Do Ferreirinha Carreirinho / Teddy Vieira Moda De Viola
A Morte Do Carreiro Zé Carreiro / Carreirinho Moda De Viola
Rei Da Capa Benedito Seviero / Pirassununga Moda De Viola
Violeiro Desprezado Craveiro / Rosinha Moda De Viola
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