Canoeiro (CHANTECLER 211405667) - (1961) - Zé Carreiro e Carreirinho

Canoeiro
Domingo de tardezinha eu estava mesmo a toa
Convidei meu companheiro pra ir pescar na lagoa
Levemos a rede de lanço ai, ai, fomos pescar de canoa

Eu levei meus apreparos pra dar uma pescada boa
Eu saí lago sereno remando minha canoa
Cada remada que eu dava, ai, ai, dava um balanço na proa

Fui descendo o rio abaixo remando minha canoa
A canoa foi rasgando foi deitando as taboas
A garça avistei de longe, ai, ai, chega perto ela voa

O rio tava enchendo muito fui encostando a canoa
Eu entrei numa vazante fui sair noutra lagoa
Fui mexendo aquele lodo, ai, ai, onde que os pintado amoa
  
Pra pegar peixe dos bão dá trabalho a gente soa
Eu jogo o timbó na água que a peixaria atordoa 
Jogo a rede e dou um grito, ai, ai, os dourados amontoa

A Morte Do Carreiro 
Isto foi no mês de agosto regulava meio dia
O sol parecia brasa queimava que até feria
Foi um dia muito triste só cigarra que se ouvia
O triste cantar dos passos naquelas matas sombrias

Numa campina deserta uma casinha existia
Na frente numa palhada onde a boiada remoía
Na estrada vinha um carro com seus cocão que gemia
Meu coração palpitava de tristeza ou de alegria

Lá no alto do serrado a sua hora chegou
O carro tava pesado e uma tora escapou
Fui por cima do carreiro e no barranco imprensou
Depois de uma meia hora que os companheiros tirou

Quando puseram no carro já não podia falar
Somente ele dizia tenho pressa de chegar
E os companheiros gritavam numa toada sem parar
Já avistaram a taperinha e as crianças no quintal

Os galos cantaram triste ai, ai, ai, ai...
No retiro aonde eu moro, ai, ai, ai, ai

Já levaram ele pra cama não tinha mais salvação
Abraçava seus filhinhos fazendo reclamação
Só sinto estes inocentes ficar seu uma proteção
Fechou os olhos e despediu desse mundo de ilusão

Boi Soberano
Me lembro e tenho saudade do tempo que vai ficando
Do tempo de boiadeiro que eu vivia viajando
Eu nunca tinha tristeza vivia sempre cantando
Mês e mês cortando estrada no meu cavalo ruano
Sempre lidando com gado desde a idade de quinze anos
Não me esqueço de um transporte seiscentos bois cuiabanos
No meio tinha um boi preto por nome de Soberano

Na hora da despedida o fazendeiro foi falando
Cuidado com este boi que nas guampas é leviano
Este boi é criminoso já me fez diversos danos
Tocamos pela estrada naquilo sempre pensando
Na cidade de Barretos na hora que eu fui chegando
A boiada estouro, ai só via gente gritando
Foi mesmo uma tirania na frente ia o Soberano

O comércio da cidade as portas foram fechando
E na rua tinha um menino de certo estava brincando
Quando ele viu que morria de susto foi desmaiando
Coitadinho debruçou na frente do Soberano
O Soberano parou ai, em cima ficou bufando
Rebatendo com o chifre os bois que vinham passando
Naquilo o pai da criança de longe vinha gritando

Se esse boi matar meu filho eu mato quem vai tocando
E quando viu seu filho vivo e o boi por ele velando
Caiu de joelho por terra e para Deus foi implorando
Salve meu anjo da guarda desse momento tirano
Quando passou a boiada o boi foi se retirando
Veio o pai dessa criança me comprou o Soberano
Esse boi salvou meu filho ninguém mata o Soberano

Pirangueiro
Construí o meu ranchinho amarradinho de cipó
Na beira do rio Mogi lá pra aqueles cafundó
Naquelas beira de rio sem vizinho eu moro só

Quando chega a tardezinha que já vai sumindo o sol
Preparo meu viradinho meu piquá de tiracol
Eu solto minha canoa vou pescar de tromombó

Desço até no porto velho onde o rio faz caraco
Naqueles poços mais fundos é que dá peixe maior
Armadilha mais segura é meu covo de cipó

Vai no bico da canoa o lampião que é meu farol
A espingarda carregada com cartucho juveló
Os peixes cai na canoa que nem milho no paiol

Quando é de madrugada canta o galo carijó
A canoa tá lotada eu termino o tromombó
Eu pesco na água limpa não preciso do timbó

Preto Fugido
Do jeito que me contaram eu vou contar bem direitinho
Que um dia o pai de Suzana saiu passear no vizinho
Suzana ficou em casa companheiro um irmãozinho
E um preto tava sondando de dentro de um capãozinho
Aproveitou a oportunidade roubou a pobre mocinha

O preto disse à Suzana veja todos os seus vestidos
Bem depressa e bem ligeiro que o momento está vencido
Que de hoje por diante eu vou ser vosso marido
A Suzana vendo isso dava suspiro doído
Ela se viu obrigada acompanhar o preto fugido

Suzana se viu no aperto no momento ela pensou
Pegou um punhado de sal e consigo ela levou
Deixo sal esparramado por todo lugar que andou
Papai vem seguindo o sal e vem achar aonde eu estou
Justamente saiu certo como a Suzana pensou

O preto era indecente em feio estado ele estava
Já fazia muito tempo que nas matas ele habitava
Com a roupa toda rasgada quase sem roupa se achava
Cabelo tava comprido as unha ele não cortava
Parecia fera bruta que nas montanhas morava

O preto disse à Suzana eu sou de cor, mas sou de raça
Você vai morar comigo e sem comer você não passa
Eu tenho o meu trabuco que é meu matador de caça
Não pense em fugir de mim este papel você não faça
Se você tentar fugir ai, você deita na fumaça

Pra Suzana não fugir no colo dela ele deito
Ele já pegou no sono e seu querido pai chegou
Pois o revólver no ouvido e um tiro ele disparou
O preto tava dormindo como tava ele ficou
Tava com sono pesado e nunca mais ele acordou

Cruel Destino
Helena uma linda moça, filha de um rico doutor, ai
Adalto era moço pobre mas muito trabalhador
Se amavam desde crianças e cresceram naquele amor
Pra Heleninha era só esse, ai que aliviava sua dor
Seu coração já esteva entregue pra aquele botão de flor

No jardim que se encontravam era o ponto acostumado
Cada dia que passava seu amor era dobrado
Sua mãe chamou e lhe disse que seu pai tinha falado
Que o casamento de Helena , ai breve ia ser realizado
Pra casar-se com um francês um moço rico preparado

Coitadinha quando soube seu dia estava chegando
Também foi se entristecendo naquilo ela foi pensando
Desprezar o meu amor, ai querido de tantos anos
Com outro eu também não caso, ai conseguiu naquele plano
Pois antes prefiro a morte que casar com este fulano

Recolheu-se no seu quarto com revólver carregado
Trazia uma carta escrita e muito bem explicado
Vou morrer porque não quero ver outro moço ao meu lado
Me vista o vestido branco, ai que eu aí tenho guradado
Que  era pro meu casamento que papai tinha comprado

A morte dessa mocinha o mundo se balançou, ai
O sofrimento de Adauto só oito dias durou
Ele foi no cemitério e na campa debruçou
É o derradeiro presente Heleninha que eu te dou
Cravou o punhal no peito coração atravessou

Dois corações que se unem devem ter amor iguais, ai
Senhores pais de família note bem o tempo atrás
Que o correr do mundo velho quanto exemplo nos trás
Obrigar um coração ai, é coisa que não se faz
O amor é como um vidro se quebrar não solda mais

Bombardeio
Ai, do jeito que me contaram o negócio pra mim tá feio
Já fizeram uma reunião ai, já formaram este torneio
Ai, a respeito a cantoria querem-me tirar o galeio
Pra rebaixar o meu nome já aplicaram todos meios

Ai, já mandaram fazer moda e diz que estas modas já veio
Estas modas vem de longe enviada pelo correio
Ai, moda só de me abater ai, diz que tem caderno cheio
Pro dia do nosso encontro me fazer um bombardeio

Ai, sendo que eu não mereço de cair nestes enleios
Quando eu chego nos fandangos meus  colegas eu não odeio
Ai, todas modas que eles cantam dou valor e apreceio
Conforme repica a viola eu bato palma e sapateio

Ai, eu não sou mesmo instruído ai
Eu pouco escrevo e pouco leio ai

Ai, eu não sou mesmo instruído eu pouco escrevo e pouco leio
Mas minha sabedoria serve só pro meu custeio
Ai, quando passo a mão no pinho canto sem ter arreceio
Porque eu faço a cortesia sem pegar chapéu alheio

Ferreirinha
Eu tinha um companheiro por nome de Ferreirinha
Nós lidava com boiada desde nós dois rapazinhos
Fomos buscar um boi brabo no campo do Espraiadinho
Era vinte e oito quilômetro as cidade de Pardinho

Nos chegamos no tal campo já era cada um seguiu pra um lado
Ferreirinha foi num potro redomão muito cismado
Já era de tardezinha eu já estava bem cansado
Não encontrava o Ferreirinha nem o tal boi arribado

Naquilo avistei o potro que vinha vindo assustado
Sem arreio e sem ninguém fui ver o que tinha se dado
Encontrei o Ferreirinha numa restinga deitado
Tinha caído do potro e ando pro campo arrastado

Quando avistei Ferreirinha meu coração se desfez
Eu rolei do meu cavalo com tamanha rapidez
Chamava ele pro nome, chamei duas ou três vezes
E notei que estava morto pela sua palidez

Pra deixar meu companheiro é coisa que eu não fazia
Deixar naquele deserto alguma onça comia
Tava ali só eu e ele Deus em nossa companhia
Venho muitos pensamentos só um é que resolvia

Pra levar meu companheiro veja o quanto eu padeci
Amarrei ele pro peito e numa árvore eu suspendi
Cheguei meu cavalo em baixo e na garupa desci
E com o cabo do cabresto eu amarrei ele em mim

Sai pra aquelas estradas tão triste tão amolado
Era um frio do mês de junho seu corpo tava gelado
Já era uma meia noite quando cheguei no povoado
Deixei na porta da igreja e fui chamar o delegado

A morte desse rapaz mais que eu ninguém sentiu
Deixei de lidar com gado minha inclinação sumiu
Quando lembro esta passagem franqueza me dá arrepio
Parece que a friagem das costas ainda não saiu

Saudades De Araraquara
Eu parti de Araraquara com destino pra Goiás
Quando eu vim da minha terra atravessei Minas Gerais
Eu passei campina  triste, lagoa dos ananais
Os olhos que lá me viram de certo não me vê mais

Fiz a minha embarcação lá na estação do Brás
Meu amor me procurava notícia pelos jornais
Eu padeço ela padece, padecemos os dois iguais
Quem parte leva saudade pra quem fica é muito mais

Eu olhei para o horizonte avistei certos sinais 
Que as estrelas vão correndo deixando raios pra trás
Eu te quis ainda te quero cada vez querendo mais
Os agrados de outro amor para mim não satisfaz

O meu peito é um retiro onde meus suspiro vai
Meu coração é um cuitelo que do seu jardim não sai
Que vive beijando a rosa onde que o sereno cai 
Adeus minha rosa branca adeus para nunca mais

Duas Cartas
Eu recebi uma carta foi meu bem que me escreveu
Abri a carta pra ler a minha coragem não deu 
Só pude ler duas linhas, minha vista escureceu
Ao ler a triste notícia que meu bem desprezou eu

Com esse golpe doído que meu coração sofreu
Imaginei a minha vida que será que aconteceu
Na carta não explicava que plano novo era o seu
Não cumpriu o juramento que a ingrata prometeu

Daquele dia em diante dobrou o sofrimento meu
Acabou minha alegria meu viver se entristeceu
Mas homem deve ser homem cumprir o destino seu
Dei ela por esquecida e disse o derradeiro adeus

Quando foi um certo dia outra carta apareceu
Na carta vinha dizendo do que fez arrependeu
Eu mandei dizer pra ela que siga o caminho seu
Procure um outro amor que você pra mim morreu

Flor Proibida
Se estas minhas palavras por você for compreendida
É fácil de adivinhar a dor que eu trago escondida
Por seu amor impossível como uma flor proibida
Este segredo eu carrego, mas de lutar não sossego enquanto eu não ti ver vencida

Meu destino está ligado no teu nome Aparecida
Que apareceu de repente na estrada de minha vida
Meus dias se transformaram em noite negra e cumprida
Quando não te vejo perto sinto no peito deserto sem nunca encontrar saída

Não é somente amizade que eu sinto por ti querida
É um grande amor e paixão que não foi correspondida
Sofro muito só por que você é comprometida
O nosso amor é pecado por isso eu sofro calado até o fim de minha vida

Se eu não conseguir meu sonho venho dar-lhe a despedida
Vou me arrastando pro mundo igual as folhas caídas
Que as enxurradas carregam por entre os mares da vida
Lá bem longe na distância eu levarei na lembrança o teu nome Aparecida

Último Adeus
Vem a aurora raiando distante vou-me embora daqui soluçando
Seu amor para outro pertence não convém mais ficar esperando
Se seus lábios ingratos pudessem despedindo uniram-se aos meus
Esta valsa sentida que eu canto ouvirias baixinho meu último adeus
Adeus talvez não te vejo mais se ouvir dentro da noite os meus ais
Não procure saber por que choro e depois se souber que eu morri
Não lastime que a morte é um alívio e a vida é tão triste ausente de ti

E de branco com outro ao seu lado quando a escada da igreja descia
Era a noiva mais linda da tarde e eu era o que mais padecia
O seu véu e a grinalda de flores aumentavam os encantos seus
Vendo o povo lhe dar parabéns compreendi que era aquele o meu último adeus
Adeus talvez não te vejo mais se ouvir dentro da noite os meus ais
Não procure saber por que choro e depois se souber que eu morri
Não lastime que a morte é um alívio e a vida é tão triste ausente de ti

Sucuri
Me contou um pescador que no rio Itararé
Na barranca desse rio mora uma cobra cruel 
Essa cobra quando pia tem que ver como é que é
Deixa o povo do lugar todo de cabelo em pé

Um dia eu fui pescar e levei o Zé Mané
Fomos nesse tal lugar onde o rio não dava pé
E topamos com essa cobra nós fizemos um maranzé
A cobra quando viu nós de brava ficava em pé

Nós subimos o rio acima remando contra a maré
Essa cobra vinha atrás que dava arrepio até
Eu chamei por todo santo por São Bento e São José
E disse pro companheiro vá rezando e tenha fé

Onde o rio fez uma curva eu gritei pro Zé Mané
Abandonamos a canoa e amoitemos num sopé
A cobra passou direto parecia o Lúcifer
Nunca mais nós dois voltamos pra pescar no Itararé

As Três Cuiabanas
Eu nasci numa data feliz, bem depois do dia dezesseis
Por eu ser um menino sem pai fui criado com titio Inês
Titio era cuiabano nesta lida também me criei
Ele era criador de gado no seu regime me acostumei
Tinha laço couro de mateiro não escapava uma rês do mangueiro
Eu deixava correr trinta dias por mês

Fiz viagem pra Mato Grosso na comitiva de um calabrês
Titio me deu um burro pampa que atendia por nome truquês
Fui tirado da tropa Rio Grande outra escolha melhor não achei
Eu deixei pra mostrar minha ciência quando lá em Mato Grosso eu cheguei
Eu bambeei as rédeas do pampa e o laço pegou pelas guampas
Berrava na chincha o zebu javanês

Tinha três mocinhas na janela, Jovilhana, Clarice  e Inês
Uma delas tava me gavando paulistinha ainda surra vocês
Cuiabanos quiseram achar ruim o meu trinta na cinta eu bambeei
Pra mostra minha ciência melhor por capricho o mestiço eu soltei
Ele tinha as guampas revessa e o laço escapou da cabeça
Pelas duas mãos eu lacei outra vez

O patrão me chamou lá pra dentro eu entrei com meu jeito cortês
Eu entrei no salão de visita lá fiquei rodeado das três
Perguntou qual era a mais bonita veja só que apuro eu passei
Respondi todas três são iguais fui do jeito que eu desapurei
A mais velha é uma flor do campo, a do meio é um cravo vermelho
A mais nova é uma rosa quando esta de vez

Na hora da despedida foi preciso eu falar português
O meu coração ficou roxo foi da cor de um alho chinês
Eu deixei pra dar meus três suspiros quando o Porto pra cá atravessei
As meninas me escreveram carta brevemente a resposta eu mandei
Vou tomar a minha sorocabana quero ver as três cuiabanas
Quero ver Jovilhana, Clarice e Inês

Músicas do álbum Canoeiro (CHANTECLER 211405667) - (1961)

Nome Compositor Ritmo
Canoeiro Zé Carreiro / Alocin Cururu
A Morte Do Carreiro Carreirinho / Zé Carreiro Moda De Viola
Boi Soberano Izaltino Gonçalves De Paula / Pedro Lopes De Oliveira / Carreirinho Moda De Viola
Pirangueiro Zé Carreiro Cururu
Preto Fugido Zé Carreiro Moda De Viola
Cruel Destino Carreirinho Moda De Viola
Bombardeio Geraldo Costa / Zé Carreiro Moda De Viola
Ferreirinha Carreirinho Moda De Viola
Saudade De Araraquara Zé Carreiro Cururu
Duas Cartas Carreirinho / Zé Carreiro Cateretê
Flor Proibida Zé Carreiro / José Fortuna Cateretê
Último Adeus Fernandes / José Fortuna Rancheira
Sucuri Ado Benatti / Zé Carreiro Cururu
As Três Cuiabanas Zé Carreiro / Carreirinho Moda De Viola
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