As Flores E Os Animais - Volume 5 (CHANTECLER 211405468) - (1982) - Cacique e Pajé

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Serpente Traiçoeira
Naquele velho angico carcomido e desfolhado
Bem na beira do caminho do lugar que fui criado
Dois nomes num coração no tronco estão gravado
Eu gravei o nome sabendo que era amado
E ela gravou o meu por que sabia que eu era o seu apaixonado

Com ele no pensamento eu lavrava o duro chão
E quando o sol despedia pra esconder no espigão
Eu encontrava com ela sentindo grande emoção
No pé do velho angico ouvia a nossa canção
Da pombinha que cantava parecendo que estava sentindo a nossa paixão

O tempo foi se passando nosso amor se evoluiu
Mas um dia o destino sem piedade nos traiu
Uma cobra cascavel nosso sonhos destruiu
Pra vida da eternidade minha amada despediu
Ao perder quem eu queria senti que minha alegria com ela também partiu

O meu coração ferido e os olhos marejando
Na sombra do angiqueiro nosso amor fui relembrando
Com o cantar da pombinha minha dor foi aumentando
Sai pelo mundo afora com a dor me acompanhando
Meu sofrimento é profundo as sei que no outro mundo meu bem está me esperando

Pra Quebrar O Jejum
O bairro onde eu moro é lugar tutu
Na beira do rio Juqueri-Guaçu
Naquelas capoeiras pia o nhambu
E na tarumã só se vê jacu
Pabela vermelha parece peru

Cachorro de caça eu só tenho um
Ele fica em casa não caço nenhum
Quando sai comigo aquele zum-zum
Ele me ajuda sempre trago algum
Faço uma fritada pra quebrar o jejum

Barranqueio o rio fujo da urutu
O medo que tenho é da canguçu
Vive por ali rodando um por uru
E no poço fundo tem mandi-guaçu
Eta peixe grande de envergar o bambu

Meu anzol de espera isca de anu
Amarro na galho pra pegar o jaú
Quando eu vou pra casa eu levo sandu
Tem molho de peixe com feijão e angu
Assim me defendo é do guatambu

Amigo Incerto
Eu vou contar uma história de uma canário da terra
Morava no pé da serra era o maior cantador
Ali naquela palhada por onde ele morava
A passarada vibrava ouvindo o tal cantor
Mas tinha um gavião também admirador
Para pegar o canário certo dia ele falou

Você canta muito bem sou seu fã de corpo e alma
Queria ouvir com calma você cantando de perto
O canário respondeu vai aqui alguns estalos
E repicou no embalo cantando de peito aberto
O gavião aplaudiu até fez um comentário
Em matéria de canário você manda aqui por perto

Mas cantor foi o seu pai, eh, canário que cantava
Até o olho ele fechava e tremia de emoção
Por que não experimenta cantar de olho fechado
Eu escuto aqui do lado disse o velho gavião
O canário fechou o olho e o rapino atacou
Mas o canário esquivou e o traidor bateu no chão

O gavião ficou sem graça, perdeu a caça do dia
Por que o canário fugia mostrando ser mais esperto
A lição serve pra nós principalmente os violeiros
Por que temos companheiros que é melhor não ter por perto
Existe um velho ditado quando o amigo é incerto
Podemos fechar um olho, mas com o outro bem aberto

Quem Dá Amor Recebe Amor
Foi por amor que peguei o machado encorajado e derrubei o mato
Fiz o meu rancho muito caprichado bem situado a beira do regado
Foi por amor que na lua minguante tirei madeira e arranquei capim
Fiz com amor e demorei bastante, mas no rancho não vai dar cupim

Do outro lado do ribeirãozinho fiz o roçado para plantação
De cada coisa plantei um pouquinho pra no meu rancho não faltar o pão
Pra ela não passar por dentro d'água fiz a pinguela com o corrimão
Onde há amor e não existe mágoa a gente luta com satisfação

Arretirado eu fiz o chiqueiro para o mau cheiro não atrapalhar
Lá no terreiro fiz o galinheiro pra galinhada não esparramar
Fofei a terra de fazer canteiro cerquei a horta pra ela plantar
Salsa, cebola e pimenta de cheiro no meu tempero nunca vai faltar

Valeu à pena ser um corajoso valeu à pena derramar suor
Todo caboclo que é caprichoso mulher bonita sabe dar valor
Minha cabocla parece uma rosa e para ela eu sou um beija-flor
A nossa vida é maravilhosa recebe amor quem sabe dar amor

Resto De Comida
Eu entrei num restaurante e sentei lá num cantinho
Nisso chegou uma mulher rodeada de filhinho
Pediu um resto de comida nem que fosse um bocadinho
O garçom foi empurrando por cima dos menininhos
Se tem fome a culpa é sua se ponha no olho da rua e vai limpando o meu caminho

Vendo aquela triste cena eu me revoltei sozinho
Ao garçom eu fui dizendo tome cuidado mocinho
Eu não sou nenhum ricaço mais também não sou mesquinho
Ela é um ser humano e necessita de carinho
Ninguém põe ela pra fora respeite bem essa senhora e esses pobres coitadinho

Ela vai comer aqui com seus filhos reunidos
Negar um resto de comida é um golpe dolorido
Põe a toalha na mesa e atenda o meu pedido
O que vier pra mim comer pra ela será servido
Eu pagarei a quantia, mas traga o prato do dia e não me venha com sortido

A senhora sofre muito vejo pelo seu semblante
Ela contou sua estória silenciou o restaurante
Meu marido foi um homem que por nós lutou bastante
Honrado e trabalhador no serviço era constante
Mas ele foi assaltado e morreu assassinado pelas mãos de um assaltante

Esse grande sofrimento é o que hoje me consome
Criminoso está preso mais não vou dizer seu nome
Sei que ele está pagando pela justiça dos homens
Na cadeia tem conforto lá ele bebe e come
Por causa de um vagabundo fiquei sozinha neste mundo e os filhos passando fome

Cultura E Sabedoria
Nem todos que tem cultura possuem sabedoria
Cultura a gente decora no livro do dia a dia
Sabedoria é divina é dom que nasce com a gente
É força intuitiva quem tem cadeira cativa na faculdade da mente

Tem caboclo lá da roça sem cultura e sem estudo
Mas com seu sexto sentido advinha quase tudo
Pela posição da lua sabe quando vai chover
Se prepara e vai plantar pedindo a Deus pra ajudar para sempre ele colher

Cultura é decorativa se aprende de tanto ler
E tudo que é decorado pode de novo esquecer
Toda porta de entrada sempre deixa uma saída
Sabedoria é o que fica igual grama tiririca porque faz parte da vida

Jesus nunca teve escola, mas teve sabedoria
E foi o mestre dos mestres o sábio da profecia
Jesus assombrou o mundo com doze anos de idade
Entres os mais sábios doutores deu prova de seu valor e sua capacidade

As Flores E Os Animais
Feliz do homem que um dia possa entender a verdade
Que só entre os animais existe sinceridade
As aves pelas florestas cantando ao cair da tarde
Traz pra alma da gente a paz e a felicidade

Queira bem a natureza o verde nos traz a paz
Nossos melhores amigos são os fiéis animais
As aves numa gaiola deixaram os matagais
Pais chamando pelos filhos, filhos chorando seus pais

Só os animais é que sabe dar carinho e o perdão
Uma cachorro quando apanha vem lamber as nossas mãos
Um passarinho que canta quando está numa prisão
Ele está chamando os filhos que ficaram no sertão

Entre todos os animais, as flores a perfumar
E tudo o que vem da terra temos o dever de amar
Porque viemos da terra, pra terra vamos voltar
Na terra onde nascem as flores um dia vamos pousar

Filho De Caiapós
Sou um índio brasileiro orgulho da minha raça
Sou valente, sou guerreiro e sou campeão de caça
A erva daninha morre onde minha flecha passa
Por amor a minha terra se preciso faço guerra, faço fogo sem fumaça

O meu rancho na floresta para mim é um paraíso
Minha índia Anahí me encanta com o sorriso
Eu índio feliz em todo lugar que piso
Não falo por ser gabola, mas no braço da viola eu tenho o dedo liso

Sou filho de caiapó, irmão de um povo sensato
Sou um índio sem estudo, mas só pratico bons atos
No braço dessa viola que se passa relato
Eu defendo meus direitos e falo e bato no peito como é bom morar no mato

O homem civilizado só pensa em dinheiro e guerra
Mais peço ao Deus Tupã perdoa aquele que erra
Devastando a floresta a natureza encerra
Luto pra não ser cativo mais o índio primitivo está ficando sem terra

Cuitelo Mensageiro
Acabando a frio entra o calor e tempo da mata soltar a flor
Onde vem os cuitelinho desses verde furta cor
Que chega no galho e desce aproximando do sabor
Aquele cheiro agradável os cuitelinhos dão valor
Eu invejo os passarinhos quando encontra o seu amor

Eu aqui sozinho sou um sonhador vou escrever uma carta sem professor
Vai o cuitelinho verde para ser o portador
Que voa levando a carta para um rosto encantador
O envelope é bordadinho com desenhos de pintor
Pra ninguém descobrir escrevo ilustre senhor

Vai depressa cuitelinho mas tenha cuidado por favor
O gavião perigoso ele é perseguidor
Essa ave de rapina pode ser meu traidor
Se te pegaram na viagem também vou morrer de dor
Cuidado com a armadilha e a mira do caçador

Me lembro do trem que levou meu bem fazendo fumaça foi o vapor
Depois que ela partiu me tornei um sofredor
Se ela voltar um dia te agradeço beija-flor
Mas se ela não voltar vai ser o fim de um trovador
Não pego mais na viola não vou ser mais cantador

Um Pedaço De Minha Vida
Eu nasci numa data feliz sem meu pai foi que eu me criei
Quinze anos de idade eu já tinha quando o grupo escolar eu deixei
Trabalhando na lida pesada minha mãe viúva sustentei
Enfrentando as misérias da vida fui lutando e nunca reclamei
O destino é traçado por Deus e na luta da vida nunca fracassei

Me ajustei em uma comitiva fui ganhando só trinta por mês
Viajamos lá pra Mato Grosso pra fazenda do seu Martinez
Meu patrão lá comprou uma boiada setecentos zebus jaguanés
Na contagem o mestiço Fumaça escapou no meio de três
Joguei o meu laço de rodilha lacei pelo no chifre, as orelhas salvei

Fazendeiro ficou admirado me falou faça isto outra vez
E mandou soltar um pantaneiro nesta hora o meu laço aprontei
Quando o bicho pulou na mangueira atrás dele também eu pulei
Pra mostrar que sou guapo na lida foi de pealo que o boi eu lacei
Pantaneiro rolou na poeira segurei nas guampas e o laço eu tirei

Esta minha natureza não tem frio e nem calor
No mato sou ventania no jardim sou um beija-flor
No campo sou cobra verde na viola cantador
Dentro da água sou um dourado e no laço sou laçador

O Grito
O mundo esta gritando pedindo paz e amor
Quem perde o ser amado grita o grito da dor
O peão grita no lombo de um pagão pulador
Dá o grito da vitória quem luta e sai vencedor
Se um truco der um grito é o grito a seu favor

O caboclo apaixonado grita o grito da paixão
Camelô grita na rua pra poder ganhar o pão
Candidato também grita pra ganhar a eleição
Pecador arrependido gritando pede o perdão
Valente grita na briga, depois grita na prisão

Com o grito do patrão o serviço sai dobrado
Se atrasa o pagamento quem grita é o empregado
Mulher quando se assusta seu grito é desesperado
Grita o grito do desprezo quem ama sem ser amado
Viúva grita no enterro, mas logo esquece o finado

Toureiro grita na arena, na cama grita o doente
Rico grita da alegria, pobre grita descontente
Motorista também grita se alguém para na frente
O advogado grita pra defender seus clientes
Com o grito de Dom Pedro o Brasil é independente

Os Mandamentos Da Vida
Fui nascido no interior numa casinha da palha
Aprendi desde criança que só vence quem trabalha
Quem tem fé e devoção os seus planos nunca falham
Pesando nessas palavras fiz da vida uma batalha
Mas nem sempre os vencedores recebem palmas e flores ou conquistam a medalha

Já lutei com sacrifício pra poder sobreviver
Na longa escola da vida sei ganhar e sei perder
Num estouro de boiada senti a terra tremer
Já peguei mestiço a unha pra poder me defender
Neste mundo meus amigos aprendi ver o perigo sem precisar me esconder

Já passei horas amargas perdido nas sertanias
Enquanto a sorte judiava mais eu me fortalecia
Meus prantos já misturam com a chuva que caía
Cheguei salgar a boca com suor que descia
Já matei minha sede com caldo de frutas verdes que na mata existia

Já contemplei o luar pousando sobre a macega
O peso de uma cruz só calcula quem carrega
Mas o homem que trabalha tropeça, mas não sossega
Renova sua esperança todas as vezes que escorrega
Quem tem um objetivo luta enquanto está vivo, padece, mas não se entrega

Tenho sofrendo bastante nunca pensei no pior
Cada vez mais eu sonhava com um futuro melhor
Quem colhe o que semeia sente um prazer maior
Os mandamentos da vida eu agora sei de cor
Hoje moro na cidade e sinto a felicidade habitando ao meu redor

Músicas do álbum As Flores E Os Animais - Volume 5 (CHANTECLER 211405468) - (1982)

Nome Compositor Ritmo
Serpente Traiçoeira Jesus Belmiro / Cacique Cateretê
Pra Quebrar O Jejum Athos Campos / Aleixinho Corta Jaca
Amigo Incerto Tião Do Carro / João Mulato Cururu
Quem Dá Amor Recebe Amor Nonô Basílio Toada Balanço
Resto De Comida Sulino / Moacyr Dos Santos Moda De Viola
Cultura E Sabedoria José Fortuna / J. Dos Santos Querumana
As Flores E Os Animais José Fortuna / Paraíso Rasqueado
Filho De Caiapós Cacique / Eduardinho Cururu
Cuitelo Mensageiro J. Santana / Pajé / Moacyr Dos Santos Corta Jaca
Um Pedaço De Minha Vida Raul Torres Cateretê
O Grito Jesus Belmiro / Cacique / Pajé Chibata
Os Mandamentos Da Vida Cacique / Quintino Eliseu Moda De Viola
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